domingo, 25 de janeiro de 2009

Rios

O dia estava feio. O céu estava triste e chorava para o mar agitado.
Eu estava dentro do comboio, rumo a Lisboa. A minha carruagem estava cheia com uma diversidade enorme de pessoas.
Ia eu sentada no meu cantinho, com a cara esborrachada contra o vidro, fitando aquela paisagem agreste ao mesmo tempo que ia ouvindo as pessoas que me rodeavam e, juntando água e pessoas, comecei a pensar que tipo de rio seria cada pessoa daquela carruagem.
Eram muitas pessoas, por isso, transmutei a ideia. Se as diferentes partes de Fernando Pessoa fossem rios, que características teriam?
Alberto Caeiro, homem com ares do campo, inocente, simples e contraditório. O seu rio seria calmo, fresco, mas profundo, pois o seu espírito é apenas aparentemente transparente.
Ricardo Reis, o epicurista estóico, amante da mitologia greco-romana. O rio que o representa seria sereno, transparente, vagaroso e percorreria apenas os locais mais belos para seu prazer.
Álvaro de Campos, o homem da máquina, do progresso. As suas águas seriam rápidas, um pouco turvas até certo ponto do seu caminho porque, depois, passariam a ser vagarosas, olhando sempre em direcção à sua nascente, à nostalgia da sua infância, cansadas das correrias marcadas pelos locais por onde passou.
Por último, Fernando Pessoa ortónimo, o ser atormentado pelo pensamento e pergunta, o existencialista. O rio de Pessoa fluiria, não para o mar, mas deste para a nascente, para as suas origens. Teria um ritmo incerto, águas angustiadas e agitadas.
Todas estas águas, tão diferentes umas das outras, compõem o oceano imenso que é Fernando Pessoa. Um oceano genial, sábio e riquíssimo. Um oceno único.
Fernando Pessoa.

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