sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Reflexão



«Na noite escreve um seu Cantar de Amigo,
O plantador de naus a haver,
E ouve um silêncio múrmuro consigo:
É o rumor dos pinhais que, como um trigo
De Império, ondulam sem se poder ver.

Arroio, esse cantar, jovem e puro,
Busca o oceano por achar;
É a fala dos pinhais, marulho obscuro,
É o som presente desse mar futuro,
É a voz da terra ansiando pelo mar.»
( D. Dinis, Primeira Parte - Brasão,Mensagem)


Termino este capítulo do meu trabalho com o poema "D. Dinis", da Mensagem, pois neste encontro algumas semelhanças com a minha pessoa e com as minhas expectativas de trabalho.
"D. Dinis" deixa o meu trabalho em aberto, pois este nunca terá fim. A água está entranhada na nossa vida e sem ela não podemos existir, nem fisicamente nem espiritualmente. É essencial.

Comecei este blog uma noite com uma introdução ao seu tema e uma explanação do simbolismo da água. Procurei n' Os Lusíadas e na Mensagem exemplos diversos que demonstrassem a variedade de sentidos e formas que a água pode adquirir e enriqueci o meu trabalho colocando textos da minha autoria e de outros autores, referentes ao tema, tentando relacioná-los com as obras paralelamente estudadas na disciplina de Português.

Infelizmente não desenvolvi o trabalho tanto quanto gostaria. No entanto, estou decidida a dar continuidade a este blog que é o som presente desse mar futuro, o início do meu futuro neste mundo novo que é a literatura. Sinto que a minha vontade é a voz da terra ansiando pelo mar, a vontade de descobrir a vastidão que é o oceano da literatura que ondula sem se poder ver, sentindo-se e ouvindo-se apenas as suas ondas rebentarem na nossa costa apelando a nossa atenção. A minha, já a conseguiram e espero que com estas pequenas canções de amigo, com este começo de busca do oceano por achar, me torne num
plantador de naus a haver.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Desafio: A Alma do Índio




Sou pequena e grande. Sou tudo e nada. Sou o que quiser ser e não o que querem que eu seja. Hoje quero ser água. Quero ser água cristalina, aquela que refresca com um mero olhar, aquela que num só golo sacia a sede, aquela que é mais leve que todas as outras águas, quer sejam do charco, de rios e ribeiros, da chuva, nevoeiro ou até mesmo da gota de orvalho! Aquela água que é mais límpida que as límpidas águas dos lagos e que tem o fulgor das águas marítimas, cuja maresia seduz toda a humanidade.
O murmúrio da minha água lembrará que todos os oceanos, mares e rios são nossos irmãos assim como toda a natureza que nos circunda e ressuscitará todos os que morreram afogados pelo mundo. O reflexo da minha água mostrará o que cada um foi e o que fomos, o que cada um é e o que somos, o que cada um e todos nós poderemos fazer para SER. Este SER é o que nos move. Não é corpo, é energia. Esta energia leva consigo o passado, o presente e o futuro. É o que nos permite viajar em nós próprios, o que nos permite transformar e sentir o que não é fisicamente realizável. Tal como eu hoje sou água devido à minha energia, amanhã posso transformá-la em ar, em terra, em estrela, em nada. Para o fazer basta-me sentir o AMOR do universo, basta amar e ser amada. A partir daí, deixo-me sair do meu corpo para ser só energia e como energia posso ser o que quiser.
Hoje sou água.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Quinta da Regaleira


A água é um elemento purificador. Um simples banho pode fazer a diferença entre o bom e o mau-humor. A água limpa por fora e por dentro. Entra em todos os orifícios, cantos e recantos do nosso ser e arrasta consigo toda a sujidade e imperfeição.

Na Quinta da Regaleira a água purifica a nossa alma. Nesta quinta, o mistério do 'interior', do ser, envolto nos símbolos, mitos e rituais, torna todo o espaço (e seu significado) poético e maravilhoso.
A água, um dos muitos símbolos nela presentes, encontra-se sob várias formas: nos peixes, que simbolizam a fertilidade; no búzio, cujas espirais representam as etapas para a purificação; nos dragões marinhos do Portal dos Guardiães que guardam o mundo interior; na cascata que separa o mundo terreno do Além; nos poços que permitem a morte simbólica, isto é, a pessoa desce ao poço, para o mundo interior- o Inferno- de modo a que se encontre a si própria, vença os seus medos e ultrapasse as suas imperfeições (assim como Vasco da Gama e os marinheiros portugueses superaram os seus durante a viagem para a Índia), voltando à superfície, após passar pela água (por exemplo, a passagem pelo Lago da Cascata) como baptismo, ou seja, como símbolo do seu processo de purificação e renascimento (que n' Os Lusíadas é representado pelo episódio da Ilha dos Amores, onde os navegadores lusos são recompensados com a divinização, visto terem conseguido elevar-se à perfeição humana).


Para Carvalho Monteiro, o homem que idealizou todo o projecto simbólico que é a Regaleira, a água tinha um significado positivo.
Este símbolo acompanha o indivíduo durante o seu caminho interior, indicando-lhe, muitas vezes, a direcção que deve seguir (como nos túneis, onde o viajante deveria guiar-se pelo som da água a cair no lago, visto estar muito escuro para se conseguir orientar pela visão) e também faz a verificação da ascensão ao patamar superior através do 'baptismo', como se fosse a purificação final.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Canto VI

«Nos altíssimos mares, que cresceram,»

«Vendo que se sustém nas ondas tanto.»

«Quase toda alagada; a gente chama»

«As ondas de Neptuno furibundo,»

«No grão dilúvio, donde sós viveram»

Estes são alguns versos do Canto VI, d'Os Lusíadas com alusões à água, nomeadamente a uma tempestade no mar. Nestes versos Camões retrata de forma bela e musical o poder destrutivo da água, conferindo-lhe a sua força, mas sem impressionar demasiado o leitor, isto é, o poeta descreve a tempestade, mostrando quão incontroláveis são as forças da natureza, mas usa figuras de estilo como a perífrase e vocabulário erudito e joga com o ritmo e a rima dos seus versos para atenuar o momento, tornando a tempestade destruidora e magnífica ao mesmo tempo.

domingo, 9 de novembro de 2008

Inconsciente

Estava deitada na minha cama, com a cabeça afundada na minha 'almofada das insónias', a ler um livro, quando oiço as gotas da chuva cair no parapeito da minha janela. Afundei-me mais na almofada e aconcheguei-me nos cobertores. Continuei a ler. No entanto, aquela música líquida captava-me a atenção e introduzia-se na minha mente.
Uma gota bateu com força no parapeito. Mergulhei nela com as restantes gotas da chuva, juntei-as todas e o "ping-ping" deu lugar a um fio contínuo de aguá que corria para o nada. Outra gota, uma imagem em tons de cinzento. A Madalena numa praia deserta, rochosa. O céu estava claro, mas nublado, a areia era branca e contrastava com o negro das rochas, o mar, cujos braços longos beijavam os pés frios da rapariga, rebentava preguiçosamente, criando uma música suave. Madalena cantava baixinho para o mar, pedindo-lhe autorização para entrar nele. Suavemente, este replicou que sim. Madalena avançou então lentamente, murmurando a sua melodia. Já tinha água pela cintura quando parou. Ficou imóvel, de olhos fechados, deixando-se envolver pelo abraço das ondas frias, que aqueciam e lavavam o seu espírito. A sua voz foi ficando mais clara e a sua melodia mais pura. Cantava agora, não para o mar, mas o mar. E nisto, transformou-se em espuma e eu adormeci.

sábado, 8 de novembro de 2008

A Alma do Índio



Foi há algumas aulas atrás que a professora de português levou um pequeno, e no entanto, grande livro intitulado A alma do Índio. Leu-nos um excerto desse mesmo livro, como costuma fazer no início das suas aulas, uma carta escrita por Seattle, chefe índio da tribo Dawmish, ao Governador de Washington. É uma carta maravilhosa, de uma sabedoria e sensibilidade extraordinárias. À medida que a professora ia lendo o texto, apoderou-se de mim o impulso de querer possuir aquele livro, para o ler infinitamente, infinitas vezes. E foi isso mesmo que fiz. Comprei-o há uma semana e ontem comecei e acabei de o ler. Foi surreal. Senti cada palavra, cada lamentação, cada suspiro, cada desilusão, toda a esperança e fé contida em cada discurso daqueles chefes índios.
A carta que se enquadra melhor no meu trabalho é a mesma lida pela professora, pois evoca os elementos de forma simbólica. No entanto, publicarei, não apenas as citações relacionadas com a água, mas toda a carta, pois contém uma mensagem muito bela e muito forte. Uma mensagem para reflectir.


«Como se pode comprar ou vender o firmamento, ou ainda o calor da terra?
Tal ideia ainda é um mistério para nós.
Se não somos donos da frescura do ar nem do fulgor das águas, como podereis vós comprá-los?
Cada quinhão desta terra é sagrado para o meu povo.
Cada reluzente floresta de pinheiros, cada grão de areia nas praias, cada gota de orvalho nos escuros bosques, cada outeiro e até o zumbido de cada insecto é sagrado para a memória e para o passado do meu povo. A seiva que corre nas veias das árvores leva juntamente consigo a memória dos Peles Vermelhas.
Os mortos do Homem Branco esquecem-se do seu país natal quando empreendem as suas viagens pelo meio das estrelas; ao contrário, os nossos mortos nunca podem esquecer-se desta bondosa terra pois ela é a mãe dos Peles Vermelhas.
Somos parte da Terra e do mesmo modo ela é parte de nós próprios. As flores perfumadas são nossas irmãs, o veado, o cavalo, a grande águia são nossos irmãos; as rochas escarpadas, os húmidos prados, o calor do corpo do cavalo e do homem, todos fazemos parte desta grande família.
Por todas estas razões, quando o Grande Chefe de Washington nos faz chegar a mensagem de que quer comprar as nossas terras, está a pedir-nos demasiado. O Grande Chefe diz-nos, também, que nos reservará um lugar em que possamos viver confortavelmente uns com os outros. Ele passará, então, a ser o nosso pai e nós os seus filhos. Por este motivo, ponderaremos a sua oferta de comprar as nossas terras. Isto não será fácil, uma vez que esta terra é sagrada para nós.
A água cristalina que corre nos rios e ribeiros não é apenas água: simboliza também o sangue dos nossos antepassados
Se vos vendermos a terra, devereis recordar-vos que ela é sagrada e, ao mesmo tempo, ensinar aos vossos filhos que ela é sagrada e que cada reflexo nas límpidas águas dos lagos narra os acontecimentos e memórias das vidas das nossas gentes.
O murmúrio da água é a voz do meu pai.
Os rios são nossos irmãos e saciam a nossa sede; são sulcados pelas nossas canoas e alimentam os nossos filhos. Se vos vendermos a terra, devereis recordar-vos e ensinar aos vossos filhos que os rios são nossos irmãos e, do mesmo modo, também são seus irmãos, e que, portanto, devem cuidar deles com a mesma doçura com que se cuida de um irmão.
Sabemos que o Homem Branco não compreende o nosso modo de vida. Ele não saber distinguir um pedaço de terra de outro, porque ele é um forasteiro que chega de noite e retira da terra o que necessita. A terra não é sua irmã, mas sim sua inimiga e, uma vez conquistada, ele prossegue o seu caminho, deixando atrás de si a sepultura de seus pais, sem se importar com isso!
Rouba a terra aos seus filhos: também não se preocupa! Tanto a sepultura dos seus pais como o património dos seus filhos são esquecidos. Trata a sua mãe, a Terra, e o seu irmão,o Firmamento, como objectos que se compram, se exploram e se vendem da mesma forma que se vendem ovelhas ou contas coloridas. O seu apetite devorará a terra deixando atrás de si apenas o deserto.
Não compreendo, mas a nossa maneira de viver é diferente da vossa. Só de observar as vossas cidades entristecem-se os olhos do Pele Vermelha. Mas talvez seja porque o Pele Vermelha é um selvagem e não percebe nada.
Não existe um lugar tranquilo nas cidades do Homem Branco, não há sítio onde escutar como desabrocham as folhas das árvores na Primavera ou como esvoaçam os insectos.
Mas talvez isto também suceda porque sou um selvagem que não compreende nada. Basta o ruído para insultar os nossos ouvidos. Depois de tudo, que interesse tem a vida se o homem não puder escutar o grito solitário do noitibó nem o coaxar nocturno das rãs nas margens dum charco? Sou Pele Vermelha e nada entendo. Nós preferimos o suave sussurrar do vento sobre a superfície dum charco, assim como o cheiro desse mesmo vento purificado pela chuva do meio-dia ou perfumado com o aroma dos pinheiros.
O ar tem um valor inestimável para o Pele Vermelha, uma vez que todos os seres partilham um mesmo fôlego - o animal, a árvore, o homem, todos respiramos o mesmo ar.
O Homem Branco não parece estar consciente do ar que respira; tal como um moribundo que agoniza durante muitos dias é insensível ao mau cheiro.
Mas se vos vendermos as nossas terras, devereis recordar-vos que o ar é, para nós, precioso, que o ar partilha o seu espírito com a vida que mantém. O vento, que deu aos nossos avós o primeiro sopro de vida, também acolhe os seus últimos suspiros. E, se vos vendermos as nossas terras, devereis preservá-las como coisa à parte e sagrada, como um lugar onde até o Homem Branco poderá deleitar-se com o vento perfumado pelas flores das pradarias.
Por tudo isso, consideraremos a vossa oferta de comprar as nossas terras. Se decidirmos aceitá-la, estabelecerei uma condição: o Homem Branco deverá tratar os animais desta terra como seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo outro modo de vida. Tenho visto milhares de bisontes a apodrecer nas pradarias, mortos a tiro pelo Homem Branco, da janela de um comboio em andamento.
Sou um selvagem e não concebo como é que uma máquina fumegante pode ser mais importante que um bisonte que nós só matamos para sobreviver.
Que seria do homem sem os animais? Se todos fossem exterminados, o homem também morreria de uma grande solidão espiritual. Porque o que suceder aos animais também sucederá ao homem. Tudo está ligado.
Deveis ensinar aos vossos filhos que o solo que pisam é formado pelas cinzas dos nossos avós. Ensinai aos vossos filhos que a terra está enriquecida com as vidas dos nossos semelhantes, para que saibam respeitá-la. Ensinai aos vossos filhos aquilo que nós temos ensinado aos nossos, que a terra é nossa Mãe. Tudo quanto acontecer à terra sucederá aos filhos da terra. Quando os homens cospem na terra, estão a cuspir em si próprios.
De uma coisa estamos certos: a terra não pertence ao homem; é o homem que pertence à terra. isto sabemos. Tudo está ligado, como o sangue que une uma família. Tudo está ligado. Tudo o que acontece à terra acontecerá aos filhos da terra. O homem não teceu a rede da vida, ele é só um dos seus fios.
Aquilo que ele fizer à rede da vida, ele fará a si próprio.
Nem mesmo o Homem Branco, cujo Deus passeia e fala como ele de amigo para amigo, fica livre do destino comum.



POR FIM TALVEZ SEJAMOS IRMÃOS.




Veremos isso. Sabemos uma coisa que talvez o Homem Branco descubra um dia: o nosso Deus é o mesmo Deus. vós podeis pensar nesta altura que Ele vos pertence, do mesmo modo como desejais que as nossas terras vos pertençam; porém não é assim. Ele é Deus dos homens e a Sua compaixão reparte-se por igual entre o Pele Vermelha e o Homem Branco. Esta terra tem um valor inestimável para Ele, e, se a destruirmos, isso provocará a ira do Criador. Também os Brancos se extinguirão um dia, talvez antes que as demais tribos. Contaminai os vossos leitos e uma noite morrereis afogados nos vossos próprios detritos.
Contudo, vós caminhareis para a vossa destruição repletos e glória, inspirados pela força do Deus que vos guiou a esta terra e que, por algum desígnio superior, vos deu domínio sobre ela e sobre os Peles Vermelhas. Esse destino é um mistério para nós, pois não percebemos porque se exterminam os bisontes, se domam os cavalos selvagens, se saturam os mais escondidos recantos dos bosques com a respiração de tantos homens e se mancha a paisagem das exuberantes colinas com fios de telégrafo. Onde se encontra o matagal? Destruído! Onde está a águia? Desapareceu!




TERMINA A VIDA E COMEÇA A SOBREVIVÊNCIA! »