domingo, 15 de março de 2009

Uma ideia, outra ideia... Devaneios

Sei que o prazo para a entrega do trabalho já passou, mas não escrevo para ser avaliada. Hoje escrevo porque escrever confere-me liberdade, alivia-me dos pesos que decidi carregar e ajuda-me a raciocinar.

Eu escrevo em qualquer lado, a qualquer instante do dia e todos os dias. Posso não transpor o que escrevo para o papel, mas ainda assim escrevo. Tudo o que penso, todas as coisas que imagino passam por uma reflexão do meu consciente (que é bastante inconsciente) e aparecem na minha mente em forma de contos. Eu não vejo o texto na minha cabeça, vejo imagens. No entanto, existe um narrador que acompanha essas imagens e conta as suas histórias.

É um processo engraçado, o de viver através de uma história narrada por um narrador interior, de voz serena e quente e ilustrada por imagens luminosas. É como se dentro de mim vivesse uma outra pessoa encarregada de me ensinar as coisas da vida através de histórias.

O meu narrador é como um rio: sempre fresco e de pulsação irregular, vai contando histórias de forma mais elaborada, à medida que segue o seu curso e evolui no seu presente, nunca parando nem revivendo o passado, a não ser que eu o peça. Sim, porque à medida que o rio da voz que conta a história da minha vida vai passando, retiro dele os contos que quero e levo-os para o lago da minha memória, para que o narrador possa contar mais tarde. Mas esses episódios nunca são contados da mesma forma. Ao original é adicionada a nostalgia e o 'fingimento poético', pelo que resultam várias versões do mesmo conto, cada uma mais dispersa, mais madura e mais elaborada da versão anterior.

Assim como Fernando Pessoa tem os seus heterónimos , sendo que um desses heterónimos é mestre, Alberto Caeiro, que o inspira, o mesmo se passa comigo e com este narrador. Ele escreve bem melhor que eu, é mais eloquente, mais poético, mais musical, mais tudo. Quando escrevo, normalmente o narrador apodera-se do teclado ou da caneta e ajuda-me a produzir texto e a progredir e quando isso não acontece, a diferença entre textos com e sem ele é enorme.

Acho que todos nós temos outro eu dentro de nós, que pode ser mais ou menos perceptível, na medida em que é mais parecido com a própria pessoa ou não (como Bernardo Soares que quase se confunde com Fernando Pessoa), mas também pela forma como intervém no nosso dia-a-dia.
É interessante conhecer esse indivíduo que está sempre presente, sendo a nossa melhor companhia na nossa eterna solidão, e que, por não ter corpo, por ser apenas espírito e ideia, acaba por ser 'omnipotente', possuindo uma sabedoria que pertence ao nosso inconsciente e que se vai revelando através do que chamamos intuição e 'visões'. Penso que, no fundo, é daí que vem da genialidade, da conversação entre o nosso eu consciente material e o nosso eu transcendente (in)consciente que nos ajuda a evoluir e amadurecer espiritual e ideologicamente. As pessoas que desenvolvem mais essa conversação, aquelas que sonham acordadas e vivem o mundo exterior através de uma perspectiva interior, intimíssima e única (e certamente fascinante), são aquelas cujo génio é genuíno e cuja obra é aparentemente difícil de compreender, mas que é apenas complexa. São exemplos de genialidade Fernando Pessoa, que através das suas múltiplas dimensões do eu, chegou, não só à sua própria unidade, mas também à da humanidade, apresentando também uma mentalidade bastante vanguardista sobre o mundo material, o seu mundo pessoal e o mundo espiritual e Albert Einstein que nos revelou a Teoria da Relatividade, que explica que espaço e tempo são relativos, que o intervalo de tempo e o comprimento não são absolutos (e pouco mais posso dizer a respeito, pois não tenho conhecimentos suficientes para a explicar bem). Exploraram-se ao máximo: sonharam, pensaram, viveram e transcenderam a mentalidade da sua época.


"Aquilo que, creio, produz em mim o sentimento profundo, em que vivo, de incongruência com os outros, é que a maioria pensa com a sensibilidade, e eu sinto com o pensamento."
- Autobiografia sem Factos. (Assírio & Alvim, Lisboa, 2006, p. 93)


"A superioridade do sonhador consiste em que sonhar é muito mais prático que viver, e em que o sonhador extrai da vida um prazer muito mais vasto e muito mais variado do que o homem de acção. Em melhores e mais directas palavras, o sonhador é que é o homem de acção. "
-Autobiografia sem Facto. (Assírio & Alvim, Lisboa, 2006, p. 110)


"A Ciência sem a Religião é coxa, a Religião sem a Ciência é cega."
- Fonte: Einstein, Albert, Ideas and Opinions, Crown Publishers, Inc., New York, 1954


"Não existe nenhum caminho lógico para a descoberta das leis elementares do universo – o único caminho é o da intuição."
- Fonte: O Pensamento Vivo de Einstein

Consultado em: www.wikiquote.com

A vida, o pensamento e a escrita são como rios, correntes de água que vão escavando a terra (o mundo) deixando a sua marca. Se as pessoas viverem, pensarem e se expressarem intensamente e com profundidade, deixarão uma marca maior e mais rica. A capacidade criadora e a sabedoria não têm limites e são acessíveis a quem estiver aberto às mesmas.
Todos podemos alcançar o génio.

1 comentário:

Anónimo disse...

Em mais uma passagem pelos vossos blogues para repensar, reconfirmar a avaliação, eis que encontro este teu belo texto.
Ontem estive num encontro de escritores da lusofonia onde muito se debateu a questão da intuição, da inspiração. Terias gostado.
Deixo-te com estas palavras do poeta Csimiro de Brito:

"Diana (a filha, também com 8 anos), perguntou-me:
— Qual é o cúmulo da escrita? Que não sei, digo.
— É uma pessoa gostar tanto de escrever ¬— respondeu — que enche todas as folhas do mundo e depois escreve nas folhas das árvores e nas ruas e nas praias e em toda a parte do mundo..."